Um grupo formado por aproximadamente 40 alunas do Colégio Marista São Luís, no bairro das Graças, Zona Norte do Recife, denuncia montagens de fotos onde aparecem nuas. As vítimas têm entre 13 e 14 anos.
Pais e mães, responsáveis pelas vítimas, foram até a Delegacia de Polícia de Atos Infracionais, situada no bairro da Boa Vista, na área central da capital pernambucana, para registrar o caso. A DEPAI é ligada ao Departamento de Polícia da Criança e do Adolescente (DPCA). O Boletim de Ocorrência, por sua vez, só será finalizado quando mais pessoas forem ouvidas.
Por meio de uma nota, a Polícia Civil de Pernambuco (PCPE) disse que “o fato está sendo investigado” e que “nenhuma informação a mais pode ser repassada para não prejudicar as investigações em curso”.
De acordo com uma das vítimas, que pediu para não ter a sua identidade revelada, os autores das montagens dividem um grupo em um aplicativo de troca de mensagens. “São cerca de 40 meninas, que se misturam entre 13 e 14 anos. Eles pegam nossas fotos e colocam no corpo sem roupa. Os autores são do colégio, já sabemos disso. Existe um grupo no WhatsApp com quatro meninos e três é que estavam envolvidos fazendo essas montagens. O outro não falava sobre e não participava”, inicia, antes de detalhar como tomou conhecimento da produção das imagens.
“O menino que avisou para as meninas é primo de um desses meninos que fez (a montagem). Ele recebeu as fotos e falou o que estava fazendo”, prossegue.
De acordo com o pai dessa estudante, o quarteto foi “convidado a se retirar” do colégio e um dos garotos já pediu transferência. “O colégio não pode expulsar, então suspenderam eles por três dias. Pegaram os celulares e convidaram a se retirar. Um, inclusive, já pediu transferência para outra escola. Quanto aos outros, os pais vão ser ouvidos ainda”, afirma.
Segundo apuração da reportagem, o caso foi levado para a coordenação e uma reunião para tratar do assunto foi marcada pelos profissionais da instituição. A previsão é de que esse encontro aconteça nesta terça-feira (7), das 7h30 às 8h30.
O que diz advogado
Advogado criminal, Ulisses Dornelas Júnior conversou com exclusividade com a reportagem da Folha de Pernambuco sobre o caso.
Ele também ressalta que, durante a condução policial da investigação, deve ser feita uma análise ampla do cenário onde as fotos foram publicadas. E dá exemplos.
“A polícia vai apurar se, de fato, a conduta aconteceu ou não. Tendo acontecido em ambiente virtual, vai examinar as redes sociais onde o material foi divulgado. Por exemplo, grupos de WhatsApp, quem faz parte do grupo, quem inseriu a mensagem, quem postou e quem compartilhou”, alerta.
Dornelas também destaca a participação de quem salva o conteúdo em seu aparelho eletrônico e revela que há pena prevista entre um e quatro anos, além do pagamento de uma multa. “Quem armazena em seu celular ou rede social uma imagem referente à pornografia infantil, real ou fake, também poderá responder. Há esse crime específico, previsto no artigo 241-B, do Estatuto da Criança e Adolescente, sendo a pena de um a quatro anos de reclusão e multa”, detalha.
Com a certeza de que a infração existiu, a consequência para os autores pode acontecer de formas diferentes. Internação, semi-internação, liberdade assistida, prestação de serviços e advertência são algumas delas.
“O procedimento criminal movido contra adolescentes é próprio, pois, por lei, criança e adolescente não praticam crime, mas ato infracional. O caso tramita em Vara própria e eles ficarão sujeitos às medidas sócio-educativas previstas no ECA, que poderão ser: internação, semi-internação, liberdade assistida, prestação de serviços, advertência…”, enumera.
Por fim, voltando-se às vítimas, o advogado ressalta a necessidade de um acolhimento de suporte emocional por parte das autoridades que conduzirão e acompanharão as investigações.
“Em se tratando de vítimas adolescentes ou crianças, deverão ser submetidas a uma escuta especializada, a ser providenciada na delegacia ou na Vara da Infância”, explica.
O que diz o Código Penal
Art. 216-B | Produzir, fotografar, filmar ou registrar, por qualquer meio, conteúdo com cena de nudez ou ato sexual ou libidinoso de caráter íntimo e privado sem autorização dos participantes – Incluído pela Lei nº 13.772, de 2018
Pena | detenção, de seis meses a um ano, e multa.
Parágrafo único | Na mesma pena incorre quem realiza montagem em fotografia, vídeo, áudio ou qualquer outro registro com o fim de incluir pessoa em cena de nudez ou ato sexual ou libidinoso de caráter íntimo – Incluído pela Lei nº 13.772, de 2018
Divulgação de cena de estupro ou de cena de estupro de vulnerável, de cena de sexo ou de pornografia – Incluído pela Lei nº 13.718, de 2018
Art. 218-C | Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, vender ou expor à venda, distribuir, publicar ou divulgar, por qualquer meio – inclusive por meio de comunicação de massa ou sistema de informática ou telemática -, fotografia, vídeo ou outro registro audiovisual que contenha cena de estupro ou de estupro de vulnerável ou que faça apologia ou induza a sua prática, ou, sem o consentimento da vítima, cena de sexo, nudez ou pornografia – Incluído pela Lei nº 13.718, de 2018
Pena | reclusão, de um a cinco anos, se o fato não constitui crime mais grave – Incluído pela Lei nº 13.718, de 2018
Aumento de pena – Incluído pela Lei nº 13.718, de 2018
Parágrafo 1º | A pena é aumentada de um terço a dois terços se o crime é praticado por agente que mantém ou tenha mantido relação íntima de afeto com a vítima ou com o fim de vingança ou humilhação – Incluído pela Lei nº 13.718, de 2018
O que diz o Estatuto da Criança e do Adolescente.
Art. 241-E | Para efeito dos crimes previstos nesta Lei, a expressão “cena de sexo explícito ou pornográfica” compreende qualquer situação que envolva criança ou adolescente em atividades sexuais explícitas, reais ou simuladas, ou exibição dos órgãos genitais de uma criança ou adolescente para fins primordialmente sexuais
O que diz o Colégio Marista São Luís
Procurado pela reportagem da Folha de Pernambuco, o Colégio Marista São Luís, por meio de uma nota, garante que “orientou e prestou atendimento às famílias das vítimas, alunas que tiveram a imagem manipulada por aplicativo de inteligência artificial, tão logo soube do fato nesta segunda”.
Ainda no comunicado, diz que profissionais da instituição acompanharam os familiares até o registro da queixa à polícia e que também formalizaram o ocorrido ao Conselho Tutelar.
“O colégio lamenta o fato e se solidariza com as vítimas, prestando o apoio necessário. A instituição reitera o compromisso em apurar o ocorrido internamente e aplicar rigorosamente as sanções disciplinares previstas no regimento escolar. Paralelamente, irá auxiliar nas investigações policiais”, traz outro trecho do comunicado.
Fonte: Folha de PE