Veículos a bateria elétrica são, em média, três vezes mais caros que os movidos a diesel. Representantes das empresas do setor participaram de debate sobre a descarbonização da frota, na 36ª edição do Seminário Nacional da NTU, em Brasília
As montadoras e operadoras de transportes urbanos do país afirmaram, nesta quarta-feira (9), que o Brasil não possui linhas de crédito suficientes para incentivar a adoção de ônibus elétricos, que custam três vezes mais que o veículo movido a diesel. Os desafios da descarbonização da frota foram debatidos, em Brasília, durante o segundo e último dia da 36ª edição do principal seminário do setor, promovido pela Associação Nacional das Empresas dos Transportes Urbanos (NTU).
Segundo as empresas, o segmento tem potencial para reduzir as emissões de carbono, mas, além da falta de investimento para aquisição de novos veículos, vê o país caminhando a passos lentos na priorização de infraestrutura necessária para receber e operar esse novo modelo de transporte. De acordo com estudo da NTU, o país precisa de nove mil quilômetros de recuperação de vias, novos corredores e faixas exclusivas de ônibus ao custo estimado de R$ 18 bilhões.
O CFO do grupo Santa Zita, Murilo Lara, explicou que fazer a transição para ônibus elétricos requer estudos complexos para saber qual tipo de veículo seria mais adequado para cada percurso no município, volume de passageiros e estrutura das vias. “A descarbonização é uma disrupção para o setor, mas nenhum operador é contra. Acontece que não existe hoje financiamento específico para a frota de veículos elétricos”, lamentou. Segundo Lara, a empresa opera três veículos elétricos, ainda em teste, em Vitória (ES).
De acordo com Fernando Fleury, representante da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), além da questão das linhas de crédito para a compra de veículos, há uma preocupação do setor com a manutenção dos equipamentos. Segundo Fleury, dependendo do tamanho da frota, o consumo elétrico corresponde à demanda doméstica de um bairro pequeno na cidade de São Paulo. “Essa transição requer uma mudança radical em investimentos, em como vamos operar e como vamos produzir”, explicou.
Durante a palestra, Fleury também mencionou o que seria o maior desafio hoje para orientar o novo sistema de transporte urbano: a falta de uma referência de custos de operação. “Nosso grande desafio é saber quanto custa introduzir veículos elétricos em um município ou região metropolitana?”, questionou. Segundo ele, a ANTP está produzindo uma planilha que vai traçar valores médios e referências para servir de base às prefeituras, estados e empresas.
Outro ponto levantado durante o encontro foi que, embora a descarbonização atenda às necessidades climáticas, há um investimento maior em relação aos veículos comuns de hoje, com uso de diesel. Uma bateria consegue suportar uma distância de 250 quilômetros, em média. A demanda de passageiros não termina, ainda que o ônibus precise parar algum tempo para recarregar. “Por isso, dependendo de como é a reserva da empresa, ela precisa reservar 30% da frota só para suprir veículos que estão sem recarga naquele momento”, observou o representante da ANTP.
Presidente da Eletra, Milena Braga comentou que o avanço da descarbonização depende do comprometimento e da parceria de todos os setores envolvidos. “Nós dependemos muito da parceria do governo federal, da indústria, dos operadores e da população para que isso aconteça”, afirmou. A empresa é líder nacional em produção de veículos elétricos. De acordo ela, mais de 15 municípios já procuraram a Eletra para parcerias e lamentam a falta de incentivos ao crédito por parte dos bancos públicos.
O secretário nacional do Meio Ambiente Urbano e Qualidade Ambiental do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Adalberto Maluf, afirmou que a transição do sistema de transportes para um modelo de eletrificação é uma “emergência climática”. Ele citou exemplos de países, como os Estados Unidos e a China, que já amadureceram essa iniciativa.
“O governo prioriza a transição energética”, afirmou. Segundo Maluf, o BNDES prepara o lançamento de uma política de financiamento por meio de títulos verdes, com taxas diferenciadas, e deve prever linhas de crédito diferenciadas para terminais e garagens de ônibus urbanos. No entanto, não informou quando será feito o anúncio.
Também participaram como debatedores do painel “Caminhos para a descarbonização do transporte coletivo urbano” o secretário municipal de Mobilidade Urbana da prefeitura de Salvador (BA), Fabrizzio Müller Martinez, o presidente honorário da UITP-América Latina, o diretor Industrial da empresa Caio, Maurício Cunha, além do gerente de Engenharia de Planejamento e Desenvolvimento da Marcopolo, Renat Florence.