“Sempre desconfiei dele” – disse este domingo ao blog da jornalista Terezinha Nunes o bispo emérito de Caruaru, Dom Dino Merchió, o primeiro a punir o padre Airton Freire, de Arcoverde, em 2003, quando ainda respondia pela diocese de Pesqueira. Na época, Dom Dino já tinha sido nomeado bispo de Caruaru, mas continuava como administrador apostólico de Pesqueira. Em decreto proibiu o sacerdote de celebrar missas em outras lugares da diocese, restringindo-se ao ambiente da Fundação Terra.
O motivo principal, embora houvessem outros de menor importância, foi ter descoberto que o padre havia feito uma grande campanha de arrecadação para uma suposta cirurgia do coração nos Estados Unidos, se afastando do Brasil por apenas sete dias, e não fora operado. “O médico que o atendeu aqui me falou que a cirurgia poderia ser feita em São Paulo e quando o inquiri sobre isso me respondeu que quando chegou aos Estados Unidos ficou bom”.
Apesar de ter sido punido pela arrecadação imprópria, que levou centenas de pessoas aos sinais de trânsito para pedir ajuda, padre Airton nunca falou publicamente da não realização da cirurgia e nem do que fez com o dinheiro. Aos mais próximos falou que investiu na Fundaçao Terra. Ainda hoje muita gente acha que foi operado e que ainda é muito doente, como costuma relembrar.
Dom Dino que, depois de deixar Pesqueira, nunca mais falou com o padre alertou os fiéis de Caruaru em missa este domingo: “souberam do padre que foi preso?” Após confirmação dos fiéis acrescentou “cuidado com as redes sociais. Há muita gente se passando por santo e não é santo. Quando virem essas coisas procurem as autoridades da Igreja para tirar dúvidas”.
De Santo a Pecador
Não foi à-toa que Dom Dino usou a palavra “santo” para falar a seus fiéis. Padre Airton, mesmo com tudo que vem passando desde que tornou-se pública a denuncia da recifense Silvia Tavares, que o acusou, como este blog relatou à época, de conivência com o seu estupro, continua sendo chamado de santo pelas pessoas que atendeu nos mais de 40 anos de trabalho na Fundação Terra. Com dom de cura, segundo o depoimento de muitas delas, ele até pouco tempo não tinha folga na agenda para receber todos que o procuravam, passando semanas ou meses para fazer uma oração de cura.
Bispos relatam que desde jovem ele foi uma pessoa difícil de relacionamento e de cumprimento das determinações eclesiais. O feito mais antigo teria sido na época em que era seminarista e deveria se tornar diácono tendo o bispo de Pesqueira, Dom Severino Mariano, marcado a missa para sua sagração como diácono na igreja matriz do município de Sertânia. Ele desejava que o evento acontecesse em um colégio e não na Igreja mas o bispo não aceitou. Como resposta, o então seminarista ficou do lado de fora da Igreja, recusando-se a aceitar a ordem episcopal. Depois disso demorou anos para que outro bispo o tornasse diácono e depois sacerdote.
Por isso, quando as denúncias começaram a surgir ninguém da Igreja se manifestou a favor do padre. Pelo contrário, o atual bispo de Pesqueira, Dom José Luiz, o suspendeu de ordem, proibindo-o de ministrar os sacramentos e divulgou que enviara a Roma um dossiê a seu respeito. Até ser detido esta quinta-feira nem na Fundação Terra ele podia mais celebrar. Com o ambiente dentro da Igreja cada vez mais difícil, ele teria preferido se dedicar à Fundação que criou e onde exercia a função de presidente. Tinha obrigação de prestar contas ao bispo de Pesqueira mas de forma bem mais livre, viajando para outros estados e até para o Exterior para celebrar missas, fazer pregações e conseguir doações.
Formado em psicologia e muito culto – fala alguns idiomas – padre Airton, porém, sempre se apresentou muito humilde. Dizia que suas batinas eram feitas de algodão cru e realmente eram. Para morar construiu um casa pequena – que chamava de casinha – em uma parte do terreno da Fundação Terra. Exatamente na chamada “rua do lixo”, onde começou seus trabalhos sociais.
Em entrevista ao site frissonline sobre esta questão de ser santo ele retrucou dizendo “eu ainda preciso melhorar muito para me tornar ruim. E depois preciso melhorar muito para ser médio e muito mais para me tornar bom. E para ser Santo… Era um desejo desde criança. O que aconteceu eu não sei, e peço para não me digam. Sei que não serei Santo, mas uma coisa que deixo como legado: o amor à misericórdia divina e o meu amor Igreja e aos pobres”. Sobre se sentia-se realizado prosseguiu “depois de tudo feito, há ainda algo a fazer. O que eu desejo na minha vida é que a obra continue e que o legado da misericórdia permaneça. Desejo que sempre aconteça o Natal dos pobres da Rua do Lixo”.
Fonte: Blog Dellas