Pesquisadores brasileiros lançam documentário sobre Criosfera 1, instalado no centro da Antártica

Módulo autônomo localizado no deserto polar completou dez anos de envio ininterrupto de dados para a comunidade científica internacional; módulo é estação oficial cadastrada na Organização Meteorológica Mundial

Pesquisadores brasileiros publicaram na última quinta-feira (23), o documentário sobre o módulo Criosfera 1, instalado na coordenada 84°S, 79,5°W, no deserto polar Antártico, a 1.280 metros acima do nível do mar, entre o Pólo Sul geográfico e as Montanhas Ellsworth. A divulgação do audiovisual coincide com a celebração do Dia Mundial da Meteorologia. O Criosfera 1 é cadastrado na Organização Meteorológica Mundial sob o código WMO 89079 e há dez anos fornece em tempo real dados sobre temperatura, pressão atmosférica, umidade relativa, radiação solar e velocidade do vento.

O documentário com duração de 40 minutos valoriza a perspectiva de técnicos e engenheiros e relembra a construção do módulo e os avanços científicos proporcionados a partir da estação. De acordo com o texto de divulgação, foram seis meses de trabalho técnico-científico para transformar um “box vermelho” em um laboratório totalmente autônomo. Os 40 minutos do audiovisual contemplam depoimentos dos pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Marcelo Sampaio e Heber Passos; do pesquisador do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), Franco Nadal Villela; e do pesquisador e professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Heitor Evangelista.

Evangelista, que também é o coordenador científico do módulo Criosfera 1, afirma que a instalação do laboratório automatizado trouxe um ‘enorme aprendizado’ ao Programa Antártico Brasileiro (Proantar), que até 2012 se concentrava em operar na borda do continente antártico, onde está localizada a Estação Antártica Comandante Ferraz e onde ancoram os navios polares. “Dentro da Antártica é outra climatologia, outro desafio. Nesses dez anos, conseguimos manter um laboratório operacional enviando os dados remotos e em tempo real, e que estão disponíveis para toda a comunidade científica internacional”, explica o pesquisador.

A localização do Criosfera 1 é relevante para captar dados que auxiliam na compreensão de questões envolvendo a elevação do nível dos oceanos e da perda de massa de gelo da Antártica, entre outros. Outro aspecto destacado pelos pesquisadores, especialmente em relação à ciência climática, é a operação ininterrupta fornecendo dados há uma década. “Agora, com dez anos, é que começamos a olhar o fruto desse trabalho. Quando se fala em ciência climática precisa de tempo para ter base estatística”, afirma Evangelista.

No ano passado, por exemplo, o Criosfera 1 detectou uma onda de calor histórica, e em poucos dias a temperatura subiu 26 graus.

Na semana passada, pesquisadores brasileiros publicaram artigo na Nature Communications Earth and Environment sobre os efeitos da destruição do ozônio estratosférico, que aumentou a radiação ultravioleta na superfície do manto de gelo, na biota polar utilizando dados fornecidos pelo Criosfera 1. Na operação antártica de número 41, que se encerrou  no início deste ano, o módulo recebeu novos sensores para monitorar a recuperação da camada de ozônio.

As informações providas pelo Criosfera 1 também têm apoiado o debate em torno de questões atuais na comunidade científica internacional, como a possível influência de ‘rios voadores’, que transportam calor e umidade, no derretimento do setor oeste antártico.

Atualmente, há um mecanismo em debate na literatura que pode ser o principal agente responsável pelo derretimento da Antártica, que são os ‘rios voadores’ que saem da Amazônia em direção ao Atlântico. “São novos fenômenos que só podem ser descobertos estando lá. A Antártica é um continente em mudança. Nossos dados têm papel fundamental”, conclui Evangelista.

Condições severas são desafios para engenharia 

O engenheiro do Inpe, Marcelo Sampaio, relata que as condições climáticas severas da região do deserto polar, com ventos constantes, temperaturas que podem ficar abaixo de 60 graus negativos, foram os maiores desafios para a engenharia da infraestrutura do módulo e para a eletrônica e a elétrica dos equipamentos instalados funcionem de modo ininterrupto. “Saímos do paralelo 62, onde está instalada a Estação brasileira, e irmos para o paralelo 84, onde está o módulo Criosfera 1, foi um salto muito grande do ponto de vista de engenharia. As rajadas não são tão fortes, quanto na Ilha Rei George onde está a Estação, mas são constantes, 24 horas por dia, 365 dias por ano. Raras são as ocasiões em que não tem vento naquela região”, afirma Sampaio.

Outro aspecto destacado pelo engenheiro envolve a geração de energia. O abastecimento do módulo é feito totalmente por energia renovável, solar e eólica. “Embora tenha bastante sol, só tem sol por cinco meses do ano. Nos outros meses, o desafio é enfrentar os fortes ventos para que as turbinas suportem a velocidade dos ventos”, explica o engenheiro.

O Dia Mundial da Meteorologia foi estabelecido em 1950, mesmo ano em que foi criada a Organização Meteorológica Mundial (WMO, na sigla em inglês).

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.