PMs mataram indígena por asfixia no interior de Pernambuco, aponta Ministério Público

O Ministério Público de Pernambuco (MPPE) denunciou à Justiça dois policiais militares pelo crime de homicídio duplamente qualificado do indígena Edvaldo Manoel de Souza, de 61 anos. A investigação apontou que a vítima sofreu asfixia até a morte, no município de Carnaubeira da Penha, no Sertão.

O óbito ocorreu em 15 de junho de 2022. Na ocasião, o indígena da etnia Atikum foi abordado por PMs que procuravam uma espingarda de cartucho na Aldeia Olho D’Água do Padre. Durante a investigação, oito militares chegaram a ser afastados das ruas por determinação da Justiça.

AS PROVAS

JC teve acesso à íntegra da denúncia do MPPE. De acordo com o relatório, os cabos da PM identificados como Marcos Murilo Guerra de Araújo e Daniel Rodrigues Araújo foram à casa do indígena “sem que houvesse mandado judicial ou qualquer elemento indicativo de ocorrência de prática de crime no local”.

Questionada pelos PMs, o indígena negou que tivesse arma em casa. A investigação apontou que Marcos Murilo deu um tapa no tórax da vítima. Em seguida, os cabos levaram ele para uma construção de taipa (no mesmo terreno), onde tudo foi revirado em busca de objetos ilícitos. Nada foi encontrado.

Na sequência, os policiais levaram Edvaldo para trás de uma capela. Lá, o indígena foi asfixiado até morrer.

Mesmo já sem vida, a vítima foi levada pela PM até a Unidade Mista de Saúde Argemiro José Torres. Um dos filhos da vítima notou que ela apresentava um ferimento na cabeça.

Na época dos fatos, os policiais relataram no boletim de ocorrência que o indígena tinha passado mal e morrido.

“Em certo momento (Edvaldo) nos relatou que não teria se alimentado e nem tomado seu medicamento para tratamento de problemas de pressão arterial”, disse trecho do boletim.

LAUDOS E QUALIFICADORAS

Laudos periciais comprovaram sinais de trauma na cabeça e indicativos de asfixia.

“Além disso, a enfermeira que acompanhava as condições de saúde de Edvaldo, ouvida pelo Ministério Público, corroborou que este gozava de boa saúde, tendo apenas pressão alta, dentro da normalidade para a sua idade, sendo pessoa saudável e ativa. Excluídas, portanto, quaisquer outras concausas”, apontou a denúncia do MPPE enviada à Justiça.

O relatório pontuou ainda que a asfixia empregada pelos PMs indica que eles tinham a “intenção de matar a vítima ou, no mínimo, assumiram o risco de tal resultado, tendo assim, agido dolosamente na prática do homicídio”.

“A autoria é isenta de dúvidas, diante da prova testemunhal colhida nos autos, que comprova que foram os denunciados quem conduziram a vítima ao local do fato, de onde o retiraram já sem vida, após a prática do homicídio”, disse outro trecho.

Os cabos foram denunciados por homicídio duplamente qualificado (meio cruel e mediante recurso que impossibilitou a defesa da vítima). Não há prazo para julgamento.

JUSTIÇA VAI DECIDIR SOBRE AFASTAMENTO DE POLICIAIS

A denúncia foi assinada pelos promotores Alice Morais, Westei Conde, Carla Verônica Pereira, Daniel Cézar de Lima e Helena Martins.

Os promotores afirmaram à Justiça que os relatos de violência policial continuam na comunidade indígena. “Tratam-se de notícias gravíssimas de que o denunciado Murilo e outros policiais continuam realizando condutas abusivas e violentas, em face de integrantes do Povo Atikum.”

Por isso, solicitaram que a Justiça determine que os dois cabos da PMs sejam afastados e sejam impedidos de ter contato com testemunhas do processo.

Por fim, pediram que seja determinado ao comandante do Batalhão da PM e do GATI que estabeleçam um protocolo de atuação para que os policiais não ingressem em residências de moradores do território do Povo Atikum sem mandado judicial ou elementos concretos que efetivamente indiquem que estaria ocorrendo a prática de crime no interior do domicílio.

A Vara única da Comarca de Mirandiba será responsável pela decisão sobre os afastamentos dos PMs das funções públicas.

Fonte: JC

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