Ele está longe de ser novidade. Não é supertecnológico e nem está nos “trending topics”. Mas o rádio, mídia eletrônica centenária e mais antiga do país, está na mira dos pré-candidatos a presidente do Brasil.
Apenas em fevereiro, os quatro concorrentes mais bem colocados nas pesquisas de intenção de voto (Lula, Bolsonaro, Moro e Ciro) deram cerca de 30 entrevistas a rádios país afora.
Estações como Rede Nordeste de Rádio, Progresso FM de Juazeiro do Norte (CE), Rádio Verdes Mares de Fortaleza, Rádio Capital de Cuiabá, Rádio Clube de Pernambuco e Rádio Difusora de Mossoró (RN) celebraram a conversa com os presidenciáveis ― e deixaram que eles falassem à vontade.
“Para a estação e também para o ouvinte daquela localidade, é um evento muito grande um candidato à Presidência da República ir a sua cidade para falar com o veículo local”, afirma Murilo Cesar Soares, professor de sociologia da Universidade Estadual Paulista (Unesp).
“O eleitor pensa: ‘Nossa, ele veio aqui’ ou ‘esse candidato falou na rádio aqui da região’. E acaba se sentindo prestigiado”, diz o professor. Gerar esse tipo de sentimento, avalia ele, é muito importante numa campanha eleitoral.
O crescimento na pandemia
Apesar de não ter o apelo das novas mídias, como o “streaming” e as redes sociais, o rádio tem crescido em número e grau e isso vem chamando a atenção dos estrategistas de campanha.
Antes da pandemia, em 2019, segundo o Ministério das Comunicações, o total de rádios no Brasil era de 9.000 emissoras. Hoje, são 10.176 – um crescimento de 13%.
A audiência também vem aumentando. Entre o último trimestre de 2020 e o mesmo período de 2021, o rádio teve um crescimento de três pontos percentuais no total de ouvintes, segundo os dados de medição de audiência da Kantar Ibope Media. Cada ouvinte passa cerca de 4h14min por dia sintonizado em suas emissoras preferidas.
Mesmo com 100 anos de história e em um cenário de evolução das mídias digitais, o rádio segue relevante para o mercado brasileiro
Giovana Alcântara, diretora regional de desenvolvimento de negócios da Kantar Ibope Media
Com mais gente trabalhando de casa ― pelo menos nas grandes cidades ―, a audiência do rádio, até então concentrada nos carros, durante os períodos de deslocamento no trânsito, passou para os lares.
Tradicionalmente, o rádio é visto como uma companhia para os ouvintes. E, no interior, sua força é a regionalidade: a emissora local é a que divulga os fatos da comunidade.
“Em muitas localidades, não há o jornal impresso ou o site de notícias da cidade. Mas tem a emissora de rádio”, diz o publicitário baiano Fernando Barros, fundador da agência Propeg. Barros já trabalhou com candidatos em mais de 30 eleições e diz ter perdido apenas seis delas.
Para se ter uma ideia da capilaridade do rádio, o Brasil tem 5.570 cidades. Das 10.176 emissoras do território nacional, 4.746 são comunitárias ― ou seja, rádios em frequência modulada (FM), de baixa potência (25 Watts) e cobertura restrita a um raio de 1 quilômetro a partir da antena transmissora, segundo a legislação brasileira. Outras 4.129 são FMs e 1.115 são AM, além das ondas curtas e tropicais.
Ele chega a todo território nacional e é ouvido com frequência por 81% da população, segundo a Kantar Ibope Media. É uma cobertura que a internet ainda não tem: 25% da população nacional não possui acesso à internet, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua – Tecnologia da Informação e Comunicação (Pnad Contínua TIC) 2018, divulgada no ano passado.
‘Palco livre’ para os candidatos
Não é só por serem veículos de grande alcance que os presidenciáveis dão atenção às rádios. “Nem sempre os veículos de primeira grandeza estão disponíveis para o candidato falar o que quer. E isso acontece com as pequenas emissoras”, afirma Barros.
Desprezar uma mídia como essa, numa campanha nacional, seria, portanto, um erro crucial. Não por acaso, o presidente Jair Bolsonaro adotou a prática de dar entrevistas diariamente a rádios de municípios do interior desde meados de 2021.
Hoje, uma mídia se serve da outra. Mesmo que ele diga algo numa rádio muito desconhecida do interior, isso vai repercutir na grande mídia e nas redes sociais
Fernando Barros, fundador da agência Propeg
“E o conteúdo de uma emissora muitas vezes é reproduzido por outra”, lembra Átila Francucci, publicitário que também já dirigiu campanhas políticas.
O rádio, segundo ele, tem outro atrativo: por natureza, é uma das mídias mais opinativas. Não há muita verificação dos fatos. “O locutor local sempre dá suas opiniões. E quando o candidato vai na rádio e dá uma entrevista, ele aproveita esse viés para falar livremente.”
Na mídia impressa, nos jornais e na mídia tradicional isso não costuma acontecer. A regra é checar as fontes e as informações. “No rádio, se o candidato quiser contar historinha, ele conta”, comenta Francucci.
“Vira um acontecimento de coluna social”, resume o cientista político e professor Marco Antonio Carvalho Teixeira, do Centro de Estudos de Administração Pública e Governo da Fundação Getúlio Vargas (CEAPG-FGV).
Em muitos casos, o locutor não coloca o candidato contra a parede. No máximo, ele responde a ouvintes que ligam para a rádio.
“É um verdadeiro playground para os políticos. Eles falam o que querem”, resume Fernando Barros, da agência Propeg.
– CNN Brasil