“Eu tenho 3 alternativas para o meu futuro: estar preso, ser morto ou a vitória”, disse Jair Bolsonaro em agosto de 2021, muito antes de sua derrota para Lula no domingo.
“Pode ter certeza: a 1ª alternativa (estar preso) não existe”, declarou o presidente ultradireitista, durante um encontro com evangélicos.
No entanto, analistas consultados pela AFP consideram que o risco de prisão é real, mesmo que os processos possam levar anos.
Desde o início de seu mandato, Bolsonaro foi alvo de diversas investigações, em especial por desinformação, e mais de 150 pedidos de impeachment, a maioria relacionados à sua gestão da crise da covid-19, que deixou mais de 687 mil mortos no país.
Essas ameaças foram afastadas por dois aliados fundamentais: o procurador-geral da República, Augusto Aras, que se absteve de formular qualquer acusação formal contra o chefe de Estado, e o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, que se recusou a dar prosseguimento aos pedidos de impeachment.
Mas a situação mudará a partir de 1º de janeiro: quando Luiz Inácio Lula da Silva tomar posse, Jair Bolsonaro perderá o foro privilegiado.
Poderá, assim, ser julgado por tribunais de primeira instância, e não apenas pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Documentos sob sigilo
A Justiça já está atenta aos assuntos da família Bolsonaro. O Ministério Público havia denunciado no final de 2020 o filho mais velho do presidente, Flávio Bolsonaro, agora senador, por desvio de verbas e lavagem de dinheiro quando era deputado estadual do Rio de Janeiro.
A suspeita era da prática de “rachadinha”, mas o caso foi arquivado em maio, após a anulação de provas recolhidas no processo, inclusive por meio de quebra de sigilo bancário, alegando que o foro privilegiado deveria ter sido mantido.
Mas uma série de reportagens do site Uol mostrou que o MP tinha fortes indícios de que a prática era difundida na família Bolsonaro, inclusive com Jair, deputado por 27 anos antes da chegar à Presidência.
Ao fim do mandato presidencial, Jair Bolsonaro “poderá ser processado por crimes comuns, e o Ministério Público poderá abrir novas frentes de investigação”, assegura o jurista Rogério Dultra dos Santos, da Universidade Federal Fluminense (UFF).
O presidente sempre negou qualquer irregularidade, dizendo ser vítima de “perseguição política”, inclusive quando o Uol revelou recentemente que membros de sua família adquiriram 51 imóveis pagos total ou parcialmente em dinheiro em espécie de 1990 a 2022, totalizando milhões de reais.
Durante seu mandato, o presidente Bolsonaro colocou sob sigilo de 100 anos documentos, oficiais ou pessoais, que podem se revelar comprometedores. Lula prometeu, durante a campanha, que permitirá o acesso a esses documentos.
“Se o presidente Lula resolver levantar o sigilo de 100 anos para várias atividades do Bolsonaro como está prometendo, isso pode se tornar uma questão importante”, comentou Rogério Dultra dos Santos, que é membro da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABHD).
Esses documentos podem conter, por exemplo, revelações sobre interferência de pastores evangélicos no orçamento do Ministério da Educação.